Homenagem a Talya Candi

 Nosso colega Gustavo Veiga faz uma homenagem à psicanalista Talya Candi, que recentemente nos deixou.


HOMENAGEM A TALYA CANDI

Não conheci Talya Candi pessoalmente, mas desde que comecei a estudar André Green, tive a impressão que ela esteve sempre por perto. Em 2013, quando foi lançada a Revista Percurso dedicada a André Green, tive o primeiro contato com um texto dela - “Dois modelos de transferência para estados limite: da mãe morta a analidade primária. No ano seguinte, instigados pela leitura da revista, criamos um Grupo de leitura e estudos sobre André Green, no Departamento de Psicanálise do Instituto Sedes Sapientiae.

Talya Candi teve um papel muito importante para nós membros do grupo, pois ela ajudou a nos aproximarmos da obra de Green de maneira mais tranquila e acessível. O livro escrito por ela “O duplo limite: o aparelho psíquico de André Green” nos deu acesso ao universo do autor, sendo um guia que nos acompanhou e direcionou nos primeiros contatos com uma obra tão densa e complexa.

Assim como este livro teve papel importante pois abriu as portas e nos apontou caminhos, percebi que ela repetia o mesmo papel em outras frentes de seu trabalho: introduzia a obra de Green com muita qualidade e de maneira acessível.  Ouvi relatos de diversos psicanalistas que participavam de grupos de estudos, cursos, palestras e seminários com ela, elogiando a forma como ela trazia o assunto e a qualidade de suas contribuições. Na resenha do livro “Duplo limite...”, publicada na mesma revista citada acima, Rubens Volich faz uma descrição encantadora de como ela se relacionava com a obra de Green:

Talya Candi decidiu arriscar-se. Mergulhou nas complexas e revoltas correntes do universo de André Green, convidando-nos a acompanhá-la com o deleite, o prazer e o entusiasmo que acompanham as descobertas da alma e da natureza humanas. Talvez, a bem dizer, não foi propriamente uma "decisão".... Quem sabe não tenha tido escolha, a não ser deixar-se levar pelas forças irresistíveis da história, das ideias e do percurso excepcionais de um psicanalista como ele. Porém, mesmo capturada, seduzida e envolvida por tais forças, mesmo tendo alcançado uma extrema intimidade com as ideias de Green, Talya conseguiu, ao longo de seu livro, fiel a seu desejo, não se confundir com ele.

Desse lugar, íntimo, próximo, mas protegido, ela compartilha com o leitor seu percurso apaixonado, em O duplo limite: o aparelho psíquico de André Green. Um livro extremamente bem escrito e claro, apesar da complexidade dos temas e conceitos que apresenta. Uma obra respeitosa, a um só tempo, da imensa produção e das ideias de Green e do leitor, familiarizado ou não com elas. (trecho do texto “Dos limites à poesia dos conceitos” de Rubens Volich, publicado na Revista Percurso n.49/50)

Para os integrantes do nosso grupo de estudos (e imagino que para tantos outros psicanalistas de nosso país), Talya Candi compartilhou seu percurso apaixonado pela obra de Green por meio de seu trabalho, tornando-se, a meu ver, uma referência na compreensão e divulgação das ideias deste autor. Por tudo isso, sou muito grato a ela.

A notícia do seu falecimento me pegou de surpresa, mesmo não a conhecendo pessoalmente, senti sua perda. Meus pêsames aos familiares, amigos, pacientes e alunos de Talya Candi.

Gustavo Veiga – Psicanalista, membro do Departamento de Psicanálise do Instituto Sedes Sapientiae e coordenador do Grupo de Leitura e Estudos sobre a obra de André Green do mesmo Departamento.

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