Angústias são braços debruçados em varandas vazias

 No Blog do Departamento um texto/poema do colega Alcimar Alves de Souza Lima.

 Angústias são braços debruçados em varandas vazias

Angústia é tensão que ainda não ganhou extensão em palavras.

 

Nesse nó congelado, saídas não existem.

Prisão sem janelas, sem grades.

Grades permeiam a luz do sol, ventos e brisas.

Angústia, quarto escuro.

Quarto escuro potência em si, lá habita o instante sem nome.

Sensação.

Naquele cubículo somos.

Sensações.

Ora, ora. Tudo parecia tão denso, profundo, agora angústia é uma sensação.

Intensidade dor, intensidade cegueira, intensidade pressão.

 

Nunca tinha pensado que angústia era uma sensação e esta palavra angústia, carrega em si uma força asfixiante.

Instante, intensidade dor, vestindo-se de angústia.

 

Angústia é uma tensão que ainda não ganhou extensão em palavras. Um momento mágico pulsa, pulsam os períodos, tempos nos quais escorrem chuvas que molham os parágrafos dos livros.

O segredo secreto que vivemos, é uma tensão aguda. Trancafiado neste quarto, aprisionamento, tensão, vertigo.

Uma fresta surge nas paredes, ar fresco misturado com raios solares subitamente saltam sobre mim, um si mesmo sinto.

A angústia cria palavras, é pura potência explosão no corpo, vontade de explosão, que produz ex-tensão.

Angústia é a extensão de intensidades a procura de ar fresco.

Ar fresco, expressão frágil para lutar com forças poderosas.

Angústia é tensão que não ganhou extensão em palavras.

O calcanhar de Aquiles da angústia, este nó sem saída, este quarto escuro, este sepulcro perpétuo, fechado, sem ar, enfim, tem uma saída em duas palavras: ar fresco.

Opa, falei duas palavras para expressar uma sensação.

Sensação,  palavra. Não, ainda não é palavra, é glissando, som trágico quando se passa os dedos rapidamente pelas teclas de um piano.

É acúmulo de pressão naquele labirinto lacrado, escuridão, não tem palavras, não tem sintaxe, não tem linguagem.

Esta escuridão não está morta, lá pulsa ar mofento.

Não quero ar mofento, quero brisa, aragem, quero ar fresco das montanhas. Quero respirar, quero ar fresco que arrebenta paredes.

Tudo que coloquei são imagens, quero respirar estas imagens. Elas precisam ter vida dentro de mim, nesta respiração, neste metabolismo.

Eis que surge a palavra.

Ela é ex-pressão. Ganhou ritmo fluido em mim, posso construir meus períodos e muito mais...parágrafos, sentenças, sonhos e chistes. Ganhei meu tempo e meu espaço. Sendo, sendo acendo meu mundo.

Agora posso apropriar-me das sensações. Olha a palavra sensação aí de novo.

Angústia é uma tensão que ainda não ganhou extensão em palavras.

Respiração é vontade de ser em si, sendo.

Ou seja, cria através de seu ritmo, palavras. Palavras vivas que voam como pássaros em revoadas criando o céu e seu firmamento.

Vivemos e respiramos no tempo e espaço de períodos.

Opa, período é linguagem também.

No período desta minha escrita, nestes parágrafos, fontes de oxigênio, potências pulsam sol, si e lá.

O ar que respiro já içou muitas velas.

 

Alcimar Alves de Souza Lima é médico psiquiatra e psicanalista, membro do Departamento de Psicanálise do Instituto Sedes Sapientiae. É autor dos livros: Acontecimento e Linguagem, e Pulsões. Na área poética: Casa das Coisas, Paisagens Interiores e outros.

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